domingo, 23 de outubro de 2016

Dançemos, cada um no seu passo!

Quando mais jovem, adolescente eu diria, saíamos de casa para dançar.
Havia muita opção de dança, principalmente nos “bailes” que fazíamos nas casas dos amigos. Tudo de ultima hora, na área, no quintal, ou em qualquer espaço que fosse possível colocar um aparelho de som, algumas (normalmente duas) caixas, uma luz estroboscópica e, quando muito, uma mesa para se colocar as bebidas mais doces que cerveja, pois essa imperava junto ao  Sant Remy, um tal de Fogo Paulista que eu nunca tive coragem de experimentar, Martini, Wisky (barato) com guaraná ou Martini e, quando muito, uma batida no estilo caipirinha ou outra coisa inventada de momento misturando um monte de coisas que ao final fazia muitos vomitarem.
Bom, o papo é a dança e, para isso, naquela época, nos dedicávamos muito tentando aprender passos coreografados, ou um estilo sensual para dançar grudado, pois ainda existia músicas românticas (as famosas lentas) para se dançar a dois.
Era disputa em todos os ângulos. Desde a “música do momento” que era difícil de se obter, pois não havia toda essa facilidade cibernética ou facilidade de pirataria, até aos passos mais incrementados ou à pegada mais nervosa na hora da lenta que poderia render uns “amassos” ou, com sorte, algo mais.
Mas a dança era sim o que fazia a diferença. Era o que gerava disputa e a popularidade do(a) dançarino(a), por isso, nos esforçávamos horrores e até criávamos inimizades em nome da dança.
Confesso que nunca fui um pé de valsa, era apenas mais um componente aceitável, já que não costumava dançar e quando o fazia só fazia na certeza de não decepcionar – para isso eu ralava em altos ensaios solitários ou com um ou outro amigo mais chegado e paciente.
O tempo passou, estamos todos nos “enta” da vida e até hoje me alegra ver certos dançarinos cheios de energia, molejo, criatividade, boa memória corporal para reproduzir as coreografias com a mesma qualidade da época dos distantes dos “inta” e, em muitos casos, a mesma disposição.
Por mais que nos anime – falo por mim – não me causa saudosismo, tenho apenas respeito.
O mesmo respeito que muitos não tem, pois nunca o tiveram e não perceberam que o tempo passou e muita coisa mudou, ao querer julgar se alguém está dançando certo ou errado.
Se o passo é assim ou assado, ou o que quer que seja.
Tenho amigas que dançam, arrebentam no rebolado e no bailado e, apesar do tempo que se passou, continuam com curvas invejáveis, balangandã enfeitiçante e malemolência hipnotizante. Elas sofrem, pois os que não entendem e não conseguem ter todo ou parte do conjunto da obra, sentem-se humilhados, travados e até enraivecidos (inveja) por não aceitar que cada um tem seu jeito e essas estão à frente nesse quesito. E em outros também, uma vez que nem estão aí com o que rola, saem apenas para se divertir e... dançar.
Tenho amigos que dançam horrores, conduzem até velhinha com artrite e artrose num bailado envolvente e frenético o qual elas só vão se lembrar no outro dia por conta das dores de corpo, mas, em próxima oportunidade, estarão lá novamente para curtir a aventura dançante e fazer o que há de melhor num passeio social: dançar.
Outros, os pés de valsa, que sabem tudo de todos os ritmos ou que dominam um ou outro com imensa destreza, sentem-se no direito de estar ao trono julgando se um está dançando certo, se outro está dançando errado, gerando comentários indiscretos e sorrisos incomodantes, como se fossem esses os senhores e donos do ritmo, tentando afogar um sentimento frustrado de um dia ter sido grande destaque ou ter tido grande importância no mundo da dança. Coitados também, mal sabem que com isso se auto denigrem e ganham o desafeto de quem está ali, tentando fazer o que todo mundo busca fazer: soltando o corpo sem compromisso ou culpa, tentando curtir o momento e se divertir com os próprios erros ou acertos, porém, e mais que tudo, a liberdade que a vida dá.
Não importa em que patamar a pessoa esteja ou em que grupo ela possa se encaixar, o que importa, é saber que um dos direitos assegurados nesse nosso país, é o de liberdade de expressão. Dançar (certo ou errado) faz parte desse grupo. Passou a fase da disputa, do querer se aparecer dançando, apesar de que muitos têm esse talento e nos enche os olhos vendo-os fazer, mas, isso não os dá o direito de pensar que tem em mãos o martelo da justiça e que, como juízes ou reis, poderão julgar e/ou condenar os demais reles mortais de viver o momento e a sua liberdade de expressão.
O foco é esse: tentar deixar claro que, se você sabe dançar... dance!
Se você n”ao sabe mas tem vontade: dance!
Se está certo ou se está errado?!?!? Esqueça, apenas dance e se um dia entender que precisa aprimorar, que vale à pena e que isso irá lhe acrescentar algum prazer pessoal, vá aprender, é justo.
Mas o que vale mesmo é o respeito, tanto de quem sabe fazê-lo como dos que não sabem, pois num ambiente coletivo, há espaço para todos e esse limita-se à uma zona de respeito que termina exatamente onde começa-se a ignorar os direitos dos outros e aí, volta àquela postura infantil ou adolescente dos que acabam criando inimizades por motivos banais, como uma falsa concorrência imaginária que não existe, inibe e desagrega.
Vamos nos ligar e, para quem gosta, dançar... Cada um na sua, cada um no seu estilo, cada um no seu passo e não haverá atropelos.

Como dizia o jurista Antonio Evaristo de Melo Peixoto:
Vamos dançar separados pra um não pisar no pé do outro?”

#foiditoepronto




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